Não é engraçado como gostamos de repetir frases famosas, ainda que não tenhamos compromisso com a proposta e realidade que elas nos transmitem? Algumas vezes as empregamos pelo impacto de suas palavras. Noutras, as usamos para ilustrar ideias e teses que nos propomos defender.
"Bem aventurados os simples", disse Jesus. Muitos de nós sabemos que ele estava descrevendo a essência do coração e do estilo de vida dos cidadãos do Reino de Deus. Mas, nem sempre nos lembramos de que esta característica é uma das consequências de se ter uma vida dominada pelo Espírito de Deus. Aliás, nem sempre parece que é um estilo de vida que somos orientados a adotar... mas é!
Pensemos seriamente numas questões:
• Por que não somos frequentadores e participantes assíduos das reuniões de edificação da igreja? Por que nos falta simplicidade.
• Por que não valorizamos com a devida consideração as oportunidades de encontros, confraternização e comunhão da igreja? Porque nos falta simplicidade.
• Por que não praticamos sistematicamente a disciplina da confissão mútua? Porque nos falta simplicidade.
• Por que não nos apresentamos prontamente para receber ministrações graciosas de cura e livramento quando nos são oferecidas, mesmo que estejamos necessitando de tais intervenções? Porque nos falta simplicidade.
• Por que não nos envolvemos pessoalmente no socorro ao pobre, doente, preso e necessitado? Porque nos falta simplicidade.
• Por que temos dificuldades em sermos hospitaleiros? Porque nos falta simplicidade.
• Por que temos dificuldades em sermos generosos, a despeito de nossas posses? Porque nos falta simplicidade.
• Por que não nos contentamos com um ensino objetivo e catequético - por repetições - como o que Jesus compartilhou? Por que nos falta simplicidade.
• Por que não nos aproximamos das pessoas ao nosso redor, sobretudo no ambiente da comunidade local, para estreitar os relacionamentos? Por que nos falta simplicidade.
• Por que temos tanto medo e receio de relacionar em profundidade com as pessoas? Porque nos falta simplicidade.
• Por que vivemos inquietos e ansiosos acerca dos recursos financeiros e materiais? Porque nos falta simplicidade.
• Por que não nos submetemos a um processo de discipulado, ou direção espiritual? Porque nos falta simplicidade.
• Por que temos dificuldades em nos render e entregar numa atitude de adoração e louvor cheia de fervor e espontaneidade? Porque nos falta a simplicidade.
• Por que temos tanta dificuldade em pedir perdão às pessoas, mesmo estando conscientes de que as ferimos? Por que nos falta simplicidade.
• Por que preferimos, tantas vezes, continuar sem entender um ensino, ao invés de pedir ajuda, explicação ou esclarecimentos? Porque nos falta simplicidade.
• Por que temos vergonha de pedir ajuda, mesmo material, quando dela necessitamos? Por que nos falta simplicidade.
• Por que não trabalhamos apenas para suprir nossas necessidades e ajudar aos necessitados? Por que nos falta simplicidade.
• Enfim, por que não somos mais simples? Definitivamente, porque nos falta simplicidade.
É claro que a lista de questões poderia seguir, talvez, quilometricamente. No entanto, aí estão algumas questões básicas que devem nos levar a pensar, meditar profundamente, e a reagir de acordo com nossa consciência cristã e com os valores do Reino de Deus que abraçamos, se é que de fato assim o fizemos.
A simplicidade não é um simples método de se combater os supérfluos que habitam nosso estilo de vida atual. Simplicidade é uma atitude profundamente espiritual. Ela nasce no interior, no coração, e ganha vida e forma em nossas escolhas. É uma atitude, acima de tudo, libertadora!
Quem anda no caminho do discipulado de Jesus, assim o faz porque o conheceu, experimentou o impacto da Verdade absoluta, e por ela foi liberto. Portanto, um discípulo de Jesus é um indivíduo "livre", e como tal pode e deve abraçar a vida simples.
Cultivar a simplicidade é descomplicar-se. É facilitar o acesso à vida "boa", vida abundante (Jo. 10:10) para si e para os outros. É vivenciar e modelar uma espiritualidade linda, acessível, profunda e atrativa. Esse é o modelo de Jesus.
Na simplicidade, a oração é simples, é curta, mas é honesta e intensa. Na simplicidade, a adoração é fácil e espontânea, mas é verdadeira e profunda. Na simplicidade, a pregação é básica e catequética, mas é fundamental e formativa. Na simplicidade, os cultos são encontros, mas são edificantes e transformadores. Na simplicidade, a generosidade é singela, mas é constante e significativa. Na simplicidade, a comunhão é natural e desinstitucionalizada, mas é vínculo, é relacionamento. Na simplicidade, a linguagem é despretenciosa, mas é saudável e restauradora. Na simplicidade, nada é mercado, mas tudo é serviço. Na simplicidade, igreja não é prédio, mas é gente que ama estar e caminhar juntos. Na simplicidade, santificação é vida natural e integral, não é lei nem dogma, mas é santa, e é encarnacional. Na simplicidade, o evangelho é Jesus, mas é seguido de discipulado e compromisso. Na simplicidade nenhuma obra é sacrifício, tudo almeja o amor.
Possivelmente, o simples não sabe que o é. Mas, por outro lado, quem não é sabe o que lhe falta. Essa é uma realidade nossa de cada dia. Na constatação de qualquer necessidade, devemos nos reconhecer como "necessitados", e ao assumirmos tal estado, precisamos correr em busca da correta provisão. Neste caso, a direção é clara: "Vinde a mim... Aprendei de mim que sou manso e humilde" (Mt. 11:28,29) - Jesus nos chama à ele mesmo: ele é o nosso referencial absoluto. Ele é a nossa cura e a nossa libertação. Aleluia!
Bem aventurados os simples... Definitivamente, bem aventurados!
Celso Tavares
0 comentários:
Postar um comentário